A decisão da Adidas de construir uma fábrica para montagem de tênis de alta performance na Zona Franca de Manaus despertou intensa discussão dentro do governo, que poderá rejeitar a concessão de incentivos para o empreendimento. Técnicos com acesso à proposta argumentam que ela funcionará, na prática, como maneira de contornar as tarifas de importação elevadas contra calçados chineses acusados de dumping. A empresa e o governo do Amazonas rejeitam as acusações e garantem que o projeto prevê 44% de conteúdo nacional nos calçados que serão montados em Manaus.
A Adidas tem ameaçado o governo de transferir para a Argentina a instalação da fábrica que, segundo informa, contrataria 800 funcionários e seria a primeira fábrica do gênero administrada pela própria empresa e não por empresas associadas. Seus executivos têm pressionado o governo a tomar a decisão sobre a concessão dos incentivos da Zona Franca até outubro, prazo que consideram necessário para ter as instalações produzindo para fornecer durante a Copa de 2014. O prazo coincide com o período eleitoral, o que, na visão dos técnicos do governo, aumenta o desconforto.
A discussão vem se travando em torno do chamado Projeto Produtivo Básico (PPB), documento que lista os compromissos de qualquer empresa que queira gozar dos incentivos da Zona Franca. No PPB da Adidas, esta anuncia, além do plano de contratar 800 operários, intenção de investir mais de R$ 15 milhões, e aplicar 1% do faturamento em pesquisas, com a possibilidade de aproveitamento de matéria-prima da região na produção de seus sapatos esportivos. Para alguns técnicos, porém, seria instalada em Manaus apenas uma linha de montagem para finalização de produtos fabricados na Ásia.
"É um equívoco e um exagero", diz o secretário de Planejamento e Desenvolvimento Econômico do Estado do Amazonas, José Marcelo de Lima Filho. "Não pode se considerar uma tentativa de driblar o antidumping, um projeto que prevê investir 1% do faturamento de uma grande empresa em pesquisa e desenvolvimento e a criação de 800 empregos." Ele atribui a resistência a funcionários que teriam dificuldade em aceitar o projeto porque foram responsáveis pela recente regulamentação da Lei de Circunvenção, criada para evitar manobras com produtos importados para evitar as tarifas punitivas dos processos antidumping.
A Adidas, em nota enviada ao Valor, argumenta que se dispõe a manter todos os empregos e a produção atual de calçados de dois milhões de pares, e que o valor agregado no país aos tênis fabricados nas futuras instalações estará entre 30% e 44% do custo básico de cada modelo, índice que superaria "com folga o índice mínimo de 25% fixado em regulamentação (da Lei de Circunvenção) recém-implantada".
No PPB, incomoda ao governo, porém, o fato de que as partes mais sofisticadas continuarão sendo fabricadas fora do país. O PPB proposto diz que quatro das etapas de produção previstas para Manaus podem, por decisão da empresa, ser feitas no exterior, enquanto não se alcançar uma escala de produção considerada adequada.
A nova fábrica seria instalada em prédio alugado, e os investimentos previstos seriam realizados em máquinas e móveis para a montagem dos calçados, sistemas de tecnologia de informação, centros de distribuição e laboratórios de testes e pesquisas. A promessa de uso de matéria-prima amazônica é condicionada a futura "identificação" de produtos locais utilizáveis na produção.
Os técnicos do governo põem em questão o uso dos incentivos da Zona Franca para fabricação de produtos como calçados ou têxteis, com forte produção em outras regiões do país; criticam, ainda, o fato de que o conteúdo local é basicamente a mão de obra (entre 20% a 30%) e materiais menos nobres como a embalagem, atacador, palmilha, cadarço e cola. A informação de que as quatro etapas de maior sofisticação previstas na fábrica de Manaus podem não ser trazidas ao Brasil também é apontada por técnicos do governo como ponto negativo do projeto.
O Ministério do Desenvolvimento, que está analisando o processo da Adidas, informou que não comentaria o caso.
FONTE: Amazônia.org
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